domingo, 16 de junho de 2013

Sabores, cores e odores de uma manhã de outono.


A manhã acorda e, sonolenta, assovia um bom dia para os passantes.  O forte cheiro de café grafita os murmúrios dos sonhos saídos da memória enquanto bolinhos adocicados são desmanchados pela boca amargurada. O vento discreto das manhãs de outono sabe ser delicado e intenso.

Os berros emudecidos das manchetes dão conta dos protestos urbanos ocorridos na noite anterior.  Manifestantes presos, feridos são somados às vítimas alheias às causas da revolta.  Versões de relatos sobre a batalha entre indignados e repressores são esmiuçadas em letras embaralhadas. Blindados, escudos de aço, cassetes, projéteis de borrachas tentam proteger alguns da imbatível vontade de muitos de serem ouvidos. O ácido do vinagre, tornado bálsamo, ameniza a corrosão sentida na pele imberbe.   A violência do poder prescinde de motivação e procurar motivos é desnecessário quando se é oprimido.

Insolente como a juventude, temperada por sol e chuva, a manhã de outono ilumina as gotas de garoa que deslizam pelo vidro da janela, pela qual se vê a vida seguindo apressada. As lágrimas derramadas por leitosas fumaças, ressecadas, também temperam com seu sal a manhã prenhe de brisas.  Notívagos e madrugadores compartilham solitariamente, ambientes e incertezas enquanto meninos despertam pela calçada. Na velocidade em que andamos, não só a história é um pesadelo do qual se tenta despertar: o presente também o é.

Vertiginosos informes desenham labirintos por onde desorientadas conversas se perdem. A comunicação não é característica da sociedade repartida. Distintas coisas por vezes parecem ser semelhantes: informação e comunicação, discursos e diálogos. As aparências teimam em querer ser no mundo das mercadorias e do espetáculo. A vigília modernizada e consentida tudo acompanha para manter o caos disciplinado, o ordenamento da liberdade opressora.

 O frescor do café ainda esparrama seu odor e colore perspectivas desnudas de sonolência.  Os sabores, cores e odores da manhã de outono renovam esperanças como um velho carvalho a trocar sua folhagem. Enquanto isso, jovens seguem pensando e organizando a próxima passeata.

   

                                                                                                 

 

 

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