quinta-feira, 21 de junho de 2012


O colapso da mobilidade urbana em São Paulo
 Possíveis políticas para sua superação

                                                                                      por Roberto Guido



A mobilidade urbana em São Paulo entrou em colapso. Fruto do descaso histórico dos poderes públicos com as causas estruturais do problema, apresenta hoje um crise que não poderá ser enfrentada com medidas pontuais, fragmentadas e insuficientes, como, de resto, tem sido o histórico de intervenção urbana em nossa cidade.

Em primeiro lugar, cientes de que os mecanismos indutores da orientação centralizadora da malha viária paulistana são determinados pela lógica da especulação imobiliária, é necessário ter claro que se se pretende iniciar o enfrentamento do problema, é urgente iniciar o desmonte dos mecanismos de transferência da renda social da terra para setores minoritários da cidade (agentes imobiliários, construtoras, entre outros).

Para isso é fundamental a instituição de incentivos fiscais na periferia da cidade e a instituição do imposto progressivo nas áreas mais centrais: Valorizar a instituição da produção de bens e serviços na periferia, gerando emprego e renda para os setores populares e assim diminuir o peso das migrações pendulares, característica dos ambientes urbanos densamente povoados, ao mesmo tempo em que o poder público induz à ocupação dos terrenos vazios (e que não são poucos) nas áreas mais centrais.

A implementação dessa diretriz de política pública urbana, portanto, resultaria em duas consequências bastante favoráveis à cidade: No curto prazo, redução da demanda de transporte pela fixação de um maior contingente populacional próximo à sua residência por conta de uma maior oferta de bens (materiais, serviços, culturais) de maneira descentralizada. Num prazo maior, o desestímulo à ocupação periférica patrocinada pelos setores rentistas da terra que assim o fazem objetivando especular com o advento de benfeitorias públicas nessas áreas, benfeitorias essas que necessariamente também são ofertadas nas áreas mais centrais e vazias e das quais as que mais se destacam são as vias urbanas, na sua maioria convergentes para o centro e que pelo seu traçado radial, acentuam o colapso de mobilidade que assistimos hoje.


Em segundo lugar, são necessários fortes investimento em transporte público (corredores de ônibus, metrô, trens) de forma coordenada, pelas esferas federal, estadual e municipal. Para desestimular o uso de veículos pelos indivíduos, o transporte coletivo deve ter qualidade, o que está longe de ser uma realidade em São Paulo. Parece ser claro que só forças políticas que, de forma republicana, garantam ações coordenadas e integradas poderão levar à cabo essa empreitada.

Pesquisa encomendada pela ONG Nossa São Paulo ao IBOPE constata que 67% dos entrevistados reprovam as atuais políticas voltadas para a diminuição do trânsito, 70% não conseguem verificar a prioridade ao transporte coletivo, 68% reprovam o tempo de deslocamento, assim como 71% o fazem em relação à pontualidade dos ônibus (o tempo médio de espera de ônibus em São Paulo é de 22 minutos). A restrição aos ônibus fretados, política de incentivo ao uso particular por parte da prefeitura de São Paulo, é contestada por 71% dos entrevistados.*

O metrô paulistano, com apenas 74,3 km de extensão (cerca de 1/3 da extensão do seu similar na Cidade do México e que teve o início da sua construção um ano após o nosso) está saturado, é caríssimo, e sua gestão está comprometida pela completa ausência de transparência. Reformas de trens que custam quase o preço de novas aquisições, construções superfaturadas, privatizações, complementam o caos no qual estão submetidos cerca de 3,5 milhões de usuários/dia que superlotam as poucas linhas e composições existentes. Quadro similar encontraremos na rarefeita rede ferroviária estabelecida em São Paulo.

Com relação aos corredores e frota de ônibus a mesma realidade se apresenta: nenhuma expansão e aumento acentuado da demanda.


Por fim, chama a atenção a ausência de um plano cicloviário, não só para as áreas centrais, mas também para os bairros periféricos, integrado à outras modalidades de transporte, de sorte que tenhamos uma alternativa limpa e saudável do ponto de vista energético e de qualidade de vida. Mas além disso, é preciso investimento em campanhas institucionais e educacionais para valorização desse meio de transporte pelos diversos extrato sociais. Dos entrevistados pela pesquisa citada, 74% ressentem-se da ausência de ciclovias, o que demonstra o potencial que um plano cicloviário combinado com campanhas institucionais de incentivo ao uso de bicicletas poderia ter como mais um elemento para enfrentarmos o colapso da mobilidade urbana paulistana.

Não se pretende aqui esgotar esse assunto, mas demonstrar que as atuais medidas tomadas pelo poder público são insuficientes, fragmentadas, pontuais e que na maioria das vezes limitam-se à ações relativas à regulação da circulação urbana e que, de maneira alguma podem dar conta de um problema que é sistêmico e tem determinações estruturais.

*Pesquisa IBOPE sobre percepção da população encomendada pela ONG Nossa São Paulo.

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